Dúbio

Empoetada
2 min readOct 29, 2023

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A trapezista começa seu espetáculo já correndo sobre a corda bamba, sem medo algum de cair, afinal as risadas viriam de qualquer das formas, ela só queria sair dali e um bom pão e circo faz desviar o olhar pro que acontece atrás das cortinas, onde só se ouve ecos de aplausos.

Quando nos separamos não precisei mais usar a navalha que cortava a culpa da minha pele, como em finais de relacionamentos anteriores, a ferida deixada por não poder te ver já era demasiado dolorida. Tanta era a dor que a sua latência já fazia parte da minha máscara diária, dia após dia carregando o peso de um positivismo imprevisível.

O pensamento voa e aterrisa nos nossos primeiros dias como amantes, sentimentos internos individuais parecidos, um amor desmedidamente lindo, porém após um tempo, um não falava e o outro falava sem saber se comunicar propriamente, o primeiro teve sua vida pautada em fazer as coisas sozinho, isolando-se em situações de confronto e tristeza, ao outro não deixavam que fizesse as coisas sozinho, tinha uma familia controladora e se isolar no conforto do seu lar não era opção senão prisão. Dois mundos internos mágicos, diferentes sim, mas incrivelmente amorosos com todos que pisam neles. Mundos que não fazem sentido, que estão a procura de algo, como a frase única inventada por nós nas iniciais que estão na pulseira de são bento que arrebentou logo depois do nosso fim.

Esse amor tirou o açoite metafórico das minhas mãos, pressionou tanto sobre a minha casca de sequóia que ela quebrou em silêncio, silêncio esse que se moveu de encontro a mim como um provérbio sussurrando no meu ouvido: “sempre foi Dúbio”.

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